A história de amor, que chegou ao Brasil nas caravelas portuguesas, entre uma princesa mourisca e dois cavaleiros é o ponto de partida do espetáculo CANTIGA MOURA – UMA FÁBULA INDO-BRASILEIRA. A nova montagem do Núcleo Prema faz apresentações gratuitas dias 27 e 28 de janeiro, sábado e domingo, às 16h, no Teatro Arthur Azevedo e mescla dança indiana com a cultura popular brasileira unindo teatro, dança, música, teatro de bonecos e manipulação de objetos.
Com dramaturgia e composições musicais de Irani Cippiciani, que está no palco ao lado de Cassiana Rodrigues, Cintia Kawahara, Krishna Sharana e Rosana Araujo, e direção de cena de Edilson Castanheira, CANTIGA MOURA – UMA FÁBULA INDO-BRASILEIRA utiliza a estrutura de criação e composição cênica indiana chamada Abhinaya, que consiste em utilizar o corpo, as expressões faciais e os gestos de mão codificados para contar histórias.
Aliada a essa técnica, o espetáculo – contemplado pela 33ª Edição do Programa de Fomento à Dança para Cidade de São Paulo – liga o fazer único de diferentes manifestações culturais brasileiras, como o Bumba-meu-Boi e o Lelê maranhense, o Cavalo Marinho e o Caboclinho pernambucano e o Congado mineiro, de também contar histórias através de autos, folias, festas, cordões e procissões, com a dramatização tão presente nas danças indianas, ou seja, a narração de histórias interpretadas, cantadas e dançadas.
Em cena, o público acompanha a história de uma princesa disputada por dois cavaleiros, um cristão e outro mouro. Irani Cippiciani explica, que o conto antigo, onde o cavaleiro cristão sequestra a princesa e mata o cavaleiro mouro, foi sendo suavizado com o tempo para se transformar em um conto infantil e chega em CANTIGA MOURA – UMA FÁBULA INDO-BRASILEIRA com uma nova roupagem. “Agora a protagonista da história é a princesa, que não precisa decidir com qual cavaleiro quer seguir. Ela é livre e pode até se permitir ficar sozinha, cuidando da própria vida. Desse modo, a personagem feminina protagoniza a tríade arquetípica da princesa-donzela-guerreira, que transpassa nosso imaginário popular em muitos contos, poemas e canções”.
Narrativa musical e gestual
Na dança indiana a música é a narrativa que conta todo o enredo, ou seja, é parte fundamental da montagem. Por isso, as composições são em português, para trazer a estética indiana para junto do público. Desse modo, cabe a música contar a história, criar seus tempos, silêncios, cadências; criar as tônicas emocionais e pontuar, contornar, negar ou emoldurar os movimentos, as gestualidades dos dançarinos. “A pesquisa musical para este espetáculo é tão importante quanto a pesquisa corporal e gestual, porque há uma interdependência clara entre elas. A narrativa, neste caso, é musical, mas a sonoridade precisa estar intimamente vinculada a construção dos movimentos corporais que se alternam entre movimentos rítmicos e narrativos. A compreensão da língua é essencial”, conta Irani.
A trilha sonora original vem sendo composta, desde 2016, em etapas e envolve uma equipe de músicos indianos e uma equipe de músicos brasileiros. A primeira etapa já foi realizada na Índia em 2016, em parceria com os músicos da Triveni Academy of Natya. A segunda etapa consistiu, justamente, na gravação das demais partes da trilha sonora, contando com a participação de músicos brasileiros convidados. Ao todo são 12 faixas musicais, sendo três compostas na Índia e nove no Brasil.
CANTIGA MOURA – UMA FÁBULA INDO-BRASILEIRA é a segunda parte de uma trilogia cênica unindo a dança indiana e a cultura brasileira, intitulada PADAM: à procura de um corpo narrativo. O projeto nasceu fortemente vinculado a uma ideia de brasilidade, apresentada por Darcy Ribeiro, que é tríplice: ameríndia, africana e europeia. Oré Yéyè o, Oxum Tarangam, primeiro espetáculo da trilogia, falava sobre a cultura africana, agora o Núcleo Prema se debruça sobre a europeia e o terceiro e último espetáculo se voltará para os povos originários.
“No caso específico desta montagem, celebramos nossa herança ibérica que, em termos culturais, é profundamente marcada pela cristandade e pela influência otomana (árabe), mas que, em terras brasileiras, se funde ao imaginário ameríndio e africano, produzindo manifestações culturais híbridas e, exatamente por isso, únicas. Elas não são uma invenção europeia, mas uma construção genuinamente brasileira”, esclarece Irani Cippiciani.
Memórias e culturas
O ocidente cristão e o oriente islâmico são duas camadas de memória amalgamadas pela história que será contada em CANTIGA MOURA – UMA FÁBULA INDO-BRASILEIRA. Porém, como a poética do espetáculo envolve o diálogo da cultura indiana com a cultura brasileira, as Índias e as Áfricas completam o entrecruzar de memórias e culturas que se farão surgir por meio da Arte.
Os objetos culturais escolhidos para metaforizar as camadas entrecruzadas de memórias entre essas culturas foram o tecido e o traje. O algodão indiano (conhecido como chita), os panos da costa africanos e as rendas europeias estão entre os elementos que mais penetraram os continentes se infiltrando nos costumes, na moda, nos rituais religiosos e na economia. Turbantes, calçolas, saias, xales, mantilhas e véus, joias, sapatos, guarda-sóis e estampas complementam um imenso acervo inspirador de trocas culturais entre as quatro matrizes de referência.
Irani Cippiciani conta que o Núcleo Prema nasceu em 2007 como uma escola de danças indianas. Em 2009, ele se tornou um grupo de pesquisa e apenas em 2013 uma companhia de dança, com um propósito definido. “Como dançarina eu me questionava sobre a pertinência de praticar dança indiana no Brasil. Aos poucos, percebi que o que mais me interessava nessa técnica era seu imenso potencial expressivo-narrativo. Por meio do Abhinaya, habilidade de contar histórias através do corpo, do gesto, das expressões faciais codificados, numa íntima e profunda relação entre palavra, som, ritmo, cor e beleza da forma, encontrei um caminho de aproximação entre o Brasil e a Índia”.
CANTIGA MOURA – UMA FÁBULA INDO-BRASILEIRA
Com o Núcleo Prema
27 e 28 de janeiro, sábado e domingo, às 16h.
Teatro Arthur Azevedo – Av. Paes de Barros, 955 – Alto da Mooca, São Paulo.
Livre | 60 minutos | Ingressos gratuitos.